Bate-volta — dia 20: Não perdemos pra ‘qualquer um’
De olho na semifinal de hoje, Cronista vai ver Argentina x Iugoslávia de 1990 (que incluía a Croácia) e imagina ‘timaço’ se ainda fosse um só país
“Saeidat alqatat ealaa alsath!” é a tradução em árabe que encontrei para suavizar a vocês, queridos leitores e queridas leitoras de 1990, uma notícia que trago do futuro – mais precisamente 2022, de ‘quando’ vim, graças a uma Máquina do Tempo. Trata-se do destino da Seleção Brasileira na Copa do Mundo que, daqui a 32 anos, acontecerá no Catar, Oriente Médio – isso mesmo, sobre um deserto, mas com ar-condicionado nos estádios (não é piada! Nas ruas também!). No bom e velho Português: “O gato subiu no telhado!” Já deu pra sacar que o Brasil não vai se dar bem neste Mundial do próximo século, e que restará a nós, torcedores, limpar a decoração em casa e da nossa rua e sentar ao sofá pra assistir a uma semifinal sem a ‘amarelinha’. A partida reunirá seleções que estarão na mesma prateleira do Futebol, ao menos sob o nosso ponta de vista: dois cruéis e impiedosos algozes do Brasil em Copas. Sinto informar que em 2022 acabaremos novamente eliminados, nas quartas de final, pela Croácia, que assim se igualará (como ‘fantasma’!) à Argentina, que há quatro dias nos degolou aqui na Itália. Croácia será uma das sete nações que, a partir do ano que vem, vão nascer da dissolução da Iugoslávia, essa mesmo que vinha encantando o mundo e ontem caiu fora nos pênaltis, após o 0 x 0 com os argentinos. E será também numa disputa de penalidades que ganharão de nós no Catar. Viu como tudo ‘fecha’? Sincronicidades do Futebol que a gente descobre quando se é um ‘Viajante do Tempo’. “Kako super!” (“Um barato!”, no idioma croata).
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Nunca mais haverá um jogo de Copa do Mundo com a participação da Iugoslávia, que sempre fez bonito nos Mundiais (3º lugar em 1930; 4º lugar em 1962). Mesmo assim, daqui a 32 anos, no Catar, o ‘filho’ mais pródigo nos gramados do mundo, o selecionado croata, ainda será tratado como ‘zebra’, mesmo depois de ser o terceiro colocado em 1998 e vice-campeão (repito: vice-campeão!) na futura disputa de 2018, em Moscou, sim, Rússia, com temperaturas de até 14 graus negativos – depois os jogadores ficam gripados e a FIFA não sabe o porquê. Antes que todos vocês abandonem esta resenha, engasgados que estão com Maradona e Caniggia após a derrota brasileira nas oitavas, revelo que (atenção!) seremos campeões do mundo duas vezes até 2022: em 1994, nos EUA; e em 2022, no Japão e na Coréia do Sul. Como se vê, no Século 21 o Futebol estará plenamente ‘globalizado’, certo? Só que não! Balelas da FIFA…
Será tamanha a concentração do esporte no continente europeu que, pasmem, até o fim das oitavas-de-final apenas um jogador que atua em times brasileiros terá marcado gol na Copa do Catar. Nome: Arrascaeta; Nacionalidade: uruguaio. Pior: ele será também, registre-se, o único a estufar as redes jogando em um clube de qualquer país da América Latina. Outro indício: as duas equipes semifinalistas no Mundial do Oriente Médio não europeias, Argentina e Marrocos (sim, “Kako super!”), estarão recheadas de jogadores que atuam em clubes da Inglaterra, Alemanha, França, Espanha… Voltarei ao futuro com uma simpatia e vontade enormes de torcer pelos marroquinos, mas pensando sobre se não seria mais correto apoiar os nossos maiores rivais, os argentinos. Já não será mais do que a hora de nos unirmos para fazer um Futebol mais forte e vigoroso em nosso continente?
Os times ‘iugoslavos’ serão sempre assim: um monte de cara com ‘nome de remédio’ – terminado em ‘vic’ (‘vaporub’?) – mas com muito jeito para o velho e bom esporte bretão. E mesmo separados – por guerras e plebiscitos que vêm por aí – manterão, em especial no selecionado croata, uma incrível capacidade de formarem equipes competitivas e excelentes jogadores, contando costumeiramente com ao menos um ‘cracaço’ no meio-campo. Aqui na Itália, quem cumpriu este papel maravilhosamente bem foi o camisa 10 Dragan Stojkovic (olha o ‘vaporub’ aí!), também chamado pelos torcedores de ‘Piksi’. Que ‘jogadoraço’! Sem falar em Dejan Savicevic, Suker (que está chegando), Boban e outros que os gramados ainda vão conhecer. Não vou aqui me meter nas questões políticas internas do país, mas não hesito em dizer que nas próximas décadas será uma grande sorte – nossa e de todos as demais nações do Mundo da Bola – que venham a se separar, formando sete diferentes seleções filiadas à FIFA. O que teria sido do Brasil em sua trajetória ao TRI se nos separássemos em vários e pudéssemos contar apenas com jogadores do Rio Grande do Sul? E não escolhi a ‘Gloriosa Província’ do querido povo gaúcho à toa, claro. E se um segundo esquadrão fosse formado somente com atletas do Nordeste? Se bem que os jogadores deste escrete aí ao menos saberiam votar pra Presidente!
Stojkovic liderou a Iugoslávia medalha de Bronze nos Jogos Olímpicos de Los Angeles (já haviam sido Ouro em 1960; Prata em 1948, 1952 e 1956) e é o capitão do Estrela Vermelha, time que vem atormentando (e vencendo!) potências clássicas, como Real Madrid e Benfica, nas competições europeias. Lembrem-se que, para chegar à Copa da Itália, os iugoslavos venceram seu grupo nas Eliminatórias, tirando a França – curiosamente, o quarto semifinalista em 2022. Não era pra ter surpreendido ninguém, portanto, a atuação de gala com que ‘Piksi’ nos presenteou na disputa com a Espanha, pelas ‘quartas’, marcando os dois gols da vitória. Mas ontem, do outro lado, tinha Maradona. Se bem que, todo mundo viu, o craque argentino perdeu um dos pênaltis na série de cobranças que decidiu o jogo. Vale o clichê: “só erra quem bate!”
À ‘semi’ do Catar, Argentina e Croácia chegarão já tendo se enfrentado cinco vezes, duas em Copas: um 0 x 0 daqui a quatro anos; e vitória argentina (1 x 0) no Mundial seguinte, na França. De um lado, estará um craque da linhagem de Stojkovic: Modric, já então eleito o ‘melhor do mundo’ em 2018; do outro, Messi (anotem este nome!), da rara linhagem dos ‘extraterrestres’, que estará prestes a dividir a Argentina em duas ‘seitas’, conquistando parte da devoção cada vez maior prestada à Maradona, um ‘Deus’ para os argentinos, quase um Pelé.
Se os nossos vizinhos albicelestes vencerem, impedirão uma sequência de duas finalíssimas de Copa sem seleção sul-americana – o que até lá só terá ocorrido duas vezes: 1934 e 1938; e2006 e 2010. Se o triunfo for croata, o país (que estará jogando sua sétima Copa) se juntará ao seleto grupo de países que foram à final em duas edições seguidas da maior competição do Futebol. Voltarei ao futuro a tempo de assistir a esse tira-teima e convencido de que Futebol se ganha nos detalhes, a cada movimento das ‘peças’ (os jogadores) no tabuleiro. Aliás, faltou dizer: os croatas, depois da separação, vão adotar uma estranha camisa quadriculada (‘xadrez’), em vermelho e branco. Esse título eles já perderam: de ‘dobar ukus’ (‘bom gosto’). Que venha o sofá!
PARA VER OS MELHORES MOMENTOS DO JOGO
https://www.fifa.com/fifaplus/pt/watch/4jIKADfQamyRPZgrboclN3
PARA VER LANCES DE STOJKOVIC EM 1990
FICHA TÉCNICA
IUGOSLÁVIA 0 x 0 ARGENTINA (2 x 3 nos pênaltis)
Competição: Copa do Mundo de 1990, na Itália (Quartas-de-final)
Data: 30 de junho de 1990 (sábado)
Horário: 12h (local)
Local: Comunale di Firenze, em Florença (ITA)
Público: 38.971 espectadores
Árbitro: Kurt Röthlisberger (SUI)
Assistentes: Neji Jouini (TUN) e Mohamed Hansal (ALG)
IUGOSLÁVIA: Tomislav Ivković; Davor Jozic, Faruk Hadžibegić, Predrag Spasić e Zoran Vulic; Refik Sabanadzovic, Safet Susic (Dejan Savicevic), Dragan Stojkovic e Dragoljub Brnovic; Robert Prosinecki e Zlatko Vujovic, Técnico: Ivica Osim
ARGENTINA: Sergio Goycochea; Oscar Ruggeri, Julio Olarticoechea (Pedro Troglio), José Serrizuela e Juan Simon; José Basualdo, Jorge Burruchaga, Diego Maradona e Ricardo Giusti; Claudio Caniggia e Gabriel Calderon (Gustavo Dezotti). Técnico: Carlos Bilardo
Pênaltis: Argentina 3 (Serrizuela, Burruchaga, Dezotti) x Iugoslávia 2 (Prosinecki, Savicevic)
Cartões Amarelos: Julio Olarticoechea, José Serrizuela, Juan Simon, José Basualdo, Jorge Burruchaga e Pedro Troglio
Cartões Vermelhos: Refik Sabanadzovic (IUG)
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