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La Popular ícone blog La Popular Por Enrico Benevenutti Aqui contamos histórias do futebol sudaca, aquele que catimba y baila milongas com a bola no pé

Independiente: o maior vencedor da Libertadores, perto de ‘cruzeirar’

'Rey de Copas' vive crise política/financeira, não vence há 10 jogos no Argentino e faz clássico de Avellaneda contra o Racing, em meio a risco de falência

O termo ‘cruzeirar’ ganhou popularidade no futebol brasileiro durante o caos político e financeiro que levou o Cruzeiro a um inédito rebaixamento à Série B, seguido por mais dois anos sem conseguir subir, em meio a um risco real de falência. Aplicado com as devidas ressalvas, pode-se dizer que na Argentina o termo reflete a atual situação do Independiente de Avellaneda. O maior vencedor da Libertadores, com sete títulos, e por isso intitulado como Rey de Copas, se aproxima cada vez mais de uma situação irreversível e a crise geral reflete diretamente em campo. El Rojo pode ver o cenário piorar ainda mais no próximo domingo, 16, quando faz o clássico da cidade contra o Racing, em seu estádio, o Libertadores de América. Nesta quinta-feira 13, o blog La Popular, dedicado ao futebol sul-americano, repercute a difícil situação que vive o Club Atlético Independiente.

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A situação vivida pelo Independiente ganhou destaque durante esta semana. Na última terça-feira, o então presidente do clube, Fabián Doman, anunciou sua renúncia do cargo. O político foi eleito em outubro do ano passado e permaneceu no cargo por apenas seis meses. Em carta divulgada diretamente para os torcedores, Doman justificou a renúncia através da situação financeira: as dívidas estão estimadas em 25 milhões de dólares (cerca de 123 milhões de reais). 

“O clube vive tempos difíceis. Os piores de sua história. A crise econômica, esportiva e judicial não têm precedente. Conseguimos cumprir um objetivo que parecia impossível: tirar Hugo Moyano do clube”, escreveu o então presidente, fazendo referência ao ex-político que atuou no Independiente por oito anos.

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“Comecei a viver o pior quando entrei no clube: a magnitude da crise é maior do que foi previsto e o ganho econômico muito menor do que se presumia… No plano esportivo sempre há três cenários: o melhor, o regular e o ruim. A nossa situação é o terceiro cenário. Responsáveis? Todos… entendo que a crise financeira é muito mais profunda e séria. Não foram encontradas ferramentas para ajudar o Independiente”, completou Doman em sua despedida.

Em meio ao caos, até o ídolo Sérgio Agüero se manifestou: “É muito triste o que está acontecendo no clube… eu gostaria de estar no Independiente, mas há tanta gente metida lá dentro e eu vou ser sincero: não confio em ninguém. E quem entrar lá dentro vai precisar lidar com toda essa gente, é preciso expulsar todos de lá”, afirmou o ex-atacante, revelado pelo Rojo em 2003, aos 15 anos.

Não só o cargo da presidência sofreu baixa, mas também o técnico. O projeto esportivo teve início na atual temporada com Leandro Stillitano no comando, mas os resultados deixaram a desejar. Em oito partidas, apenas uma vitória, cinco empates e duas derrotas. A saída do técnico argentino aconteceu em março e, nos últimos dias, tudo indicava um acordo com Pablo Repetto, mas o treinador uruguaio declinou depois da exposição sofrida pelo Rey de Copas sobre sua crise. Segundo a imprensa argentina, o experiente Ricardo Zielinski deve ser o novo DT da equipe.

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O Independiente não vence uma partida do Campeonato Argentino há 10 rodadas. A única vitória da equipe aconteceu na estreia da temporada, contra o Talleres. Desde então, seis empates e quatro derrotas, apenas nove pontos conquistados e 25º posto na tabela, com dois pontos de distância da lanterna.

A próxima rodada é o Clássico de Avellaneda, contra o rival Racing, no estádio Libertadores de América. O encontro acontece no domingo, 16, às 16h30 (de Brasília), e pode ser um divisor de águas para o futuro da equipe vermelha. Uma derrota para o maior rival pode empurrar de vez o Rey de Copas para o fundo do poço, ou seja, um novo rebaixamento (o primeiro foi em 2013).

O clima para o clássico esquentou antes mesmo da última rodada, quando El Rojo perdeu para o Rosário Central fora de casa. Em protesto, alguns torcedores fizeram ataques aos dirigentes do clube – fato que também influenciou na renúncia do ex-presidente Doman: “recebi muitas ameaças” -.

“No dia em que matarmos um dirigente vão deixar de nos roubar”, dizia uma pichação, enquanto outra estampou o portão do estádio vermelho: “ganhem no domingo ou bala para todos”.

Antonio Lacerda
O último título do Independiente foi a Sul-Americana de 2017, contra o Flamengo, no Maracanã

‘Lei Racing’ representa alívio

Apesar da crise financeira, institucional e esportiva, a Justiça argentina não permite que a falência total feche as portas do clube, mesmo com penhoras e cessão de bens. Curiosamente, a lei que obriga o contínuo funcionamento da instituição leva, popularmente, o nome do rival: ‘Lei Racing’. Em 1999, o time azul e branco de Avellaneda teve a falência decretada, em razão das dívidas que passavam de 30 milhões de dólares. La Academia só não deixou de existir graças ao apoio de sua massa, tão fanática quanto a do vizinho (apenas 350 metros separam os estádios de Independiente e Racing).

Os mais velhos hão de se lembrar de como os anos 90 foram dominados por profecias e previsões sobre o fim dos tempos e como, a partir do ano 2000, o mundo conheceria o seu fim. Pois bem, o apocalipse de Nostradamus e companhia nunca chegou, de fato, mas a virada de século significou um pesadelo sem fim para o torcedor do Independiente.

O clube de Avellaneda, cujo maior ídolo é Ricardo Bochini, lenda das décadas de 70 e 80, entrou em uma espiral de campanhas negativas, sem conseguir bons resultados ou ser protagonista mesmo no cenário nacional. Com dívidas, o respiro foi a venda de um jovem promissor chamado Sergio “Kun” Agüero. A venda recorde para o Atlético de Madri serviu para o Independiente respirar e arrumar a casa, literalmente. O estádio La Doble Visera deu lugar ao Libertadores de América.

A oscilação retornou após o título da Sul-Americana de 2010, campanha que maquiou os problemas do clube. O resultado foi o descenso em 2013, primeiro em toda a história e que quebrou a sequência de 101 anos na primeira divisão nacional.

El Rojo retornou à elite na temporada seguinte, mas o que poderia ser uma virada de chave para o clube se tornou, na verdade, um pesadelo ainda maior. “Futebol e política, política e futebol se misturam como água e sabão, e seria ainda melhor se um e outro fossem mais limpos do que são”, bem definiu o jornalista Juca Kfouri, no livro Confesso que Perdi (2017). E o detalhe é que esse fenômeno é potencializado por 10 no país platense.

Eis que surge a figura de Hugo Moyano, líder sindicalista dos caminhoneiros e ex-presidente do Partido Justicialista, como então presidente do Club Atlético Independiente. Sob sua gestão e com Ariel Holan como técnico, a equipe conquistou a Copa Sul-Americana em 2017, em um novo Maracanazo, contra o Flamengo (de Vini Jr e Paquetá). O título foi uma ilusão na tempestade que seguiria.

No ano seguinte, Moyano foi acusado de corrupção e lavagem de dinheiro. O político seguiu no cargo até 2022, mesmo com diversas manifestações da torcida contra ele e acusações da situação se recusar a novas eleições no clube, arrastando o processo ao máximo.

Durante a gestão Moyano, o Independiente enfileirou dívidas estimadas em mais de R$ 100 milhões. Somente para Gonzalo Verón, ex-atacante do clube, o Rey de Copas deve perto dos R$ 25 milhões. As pendências financeiras trouxeram sanções esportivas por parte da Conmebol, que não deixa o time de Avellaneda realizar novas contratações.

Em seis de outubro de 2022, Moyano deu lugar a Fabián Doman, que durou seis meses no cargo e renunciou. Hoje, de maneira interina, Néstor Grindetti é o presidente do clube.

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