Muito espaço cedido e pouco criado: o que tem dado errado no Brasil de Diniz
Seleção brasileira tem tido resultados e desempenho abaixo do esperado e voltou a ser derrotada nas Eliminatórias; por que o "dinizismo" não tem funcionado?
Pela primeira vez na história, o Brasil perdeu dois jogos seguidos de Eliminatórias ao ser derrotado por 2 a 1 pela Colômbia na última quinta-feira, 16, de virada. Os problemas vistos em Barranquilla foram muito parecidos com os do revés anterior, para o Uruguai, e têm se repetido nesse início de trabalho de Fernando Diniz – que, bizarramente, também pode ser um fim de trabalho, já que, pelo menos oficialmente, o técnico interino tem só mais um jogo competitivo pela frente. Tanto os resultados quanto o desempenho têm sido ruins.
Mas por que o treinador campeão da Libertadores, que faz o Fluminense jogar um ótimo futebol, não consegue praticar o mesmo na seleção, com peças muito melhores? A resposta mais óbvia, claro, é a falta de tempo: com os poucos treinos e a falta de convivência diária, os jogadores do Brasil não têm o mesmo entendimento do modelo de jogo e a naturalidade para fazê-lo funcionar.
Mas a verdade é que os problemas vistos na seleção também acontecem no Flu, porque são inerentes às escolhas que Diniz faz ao armar seus times. A diferença é que, no clube, eles aparecem com menos frequência, enquanto os pontos positivos são mais evidentes. Tudo tem a ver com o espaço: o Brasil tem cedido muito espaço ao adversário e criado pouco espaço para si próprio.
Sem bola
Um problema claro da seleção vem sendo o alto número de gols sofridos e, principalmente, de chances cedidas ao adversário. Contra a Colômbia, só a atuação de Alisson evitou uma derrota ainda mais elástica. Com a escolha de usar apenas dois meio-campistas, Diniz viu o setor ser totalmente dominado pelos colombianos, que tinham sempre três ou quatro jogadores ali. André e Bruno Guimarães ficaram sobrecarregados, tendo que escolher entre pressionar à frente e deixar o espaço às costas, ou guardar posição à frente da área e deixar o portador da bola com mais liberdade.
Quem melhor aproveitou esse espaço foi James Rodríguez. O camisa 10 colombiano ditou o ritmo do jogo de uma forma que lembrou seus melhores dias, mesmo em uma intensidade bem abaixo da ideal. O motivo: ele sempre conseguiu encontrar espaço para receber a bola longe da marcação. Enquanto André e Bruno Guimarães estavam focados em outros meio-campistas, James flutuava pelo campo em busca do espaço vazio e fazia o time jogar com seus passes.
A transição defensiva – ou seja, o momento em que o time perde a bola – também vem sendo um grande problema. Aqui, é impossível não traçar o comparativo com Tite, que tinha nesse momento do jogo um de seus pontos fortes; quando o Brasil perdia a posse, na maioria das vezes já conseguia pressionar e recuperar logo em seguida. Os jogadores já ficavam organizados e posicionados com a bola de forma a facilitar essa recuperação. Com Diniz, não há essa preocupação especial, e o resultado é que muitos contra-ataques adversários terminam na área do Brasil e levam perigo.
Mas por que no Fluminense funciona? A verdade é que a transição defensiva também é um ponto fraco no Flu, apesar de ter sido aprimorada ao longo de um ano e meio de trabalho de Diniz. É uma escolha tática que vem do modo como o treinador gosta de organizar seu ataque: em vez de “distribuir” os jogadores pelo campo, ele os estimula a se aproximarem o máximo possível, agrupando vários de um mesmo lado, por exemplo. Isso inevitavelmente deixa partes grandes do campo descobertas quando o time perde a bola. No Flu, porém, a alta produção ofensiva do time acaba “compensando” essa vulnerabilidade.
Com bola
E aí chegamos ao outro ponto: a dificuldade da seleção de criar espaços no ataque ao adotar o estilo “dinizista” de se organizar ofensivamente. Sim, há organização no ataque de Diniz, apesar de, quando as coisas não funcionam, tudo parecer uma bagunça. Existem movimentos estimulados e treinados, com uma saída de bola padronizada, jogadores ocupando alturas diferentes do campo para dar opções de passe próximas, e pelo menos uma opção do lado oposto para inverter o jogo, por exemplo. Na seleção, porém, pouco disso tem fluído por enquanto.
O gol de Martinelli contra a Colômbia mostra bem um momento em que a ideia de Diniz funcionou: Vinicius Júnior pegou a bola por dentro, tabelou com o ponta-esquerda, que também estava por dentro, invadiu a área cercado por colombianos e devolveu para Martinelli, que marcou. Foi um golaço. O problema é que essas situações não têm se repetido com frequência e naturalidade; na verdade, o que mais temos visto são jogadores “embolados”, sem opções claras de passe em profundidade ou movimentos que se completam, o que facilita que o adversário negue os espaços.
Mesmo na goleada por 5 a 1 contra a Bolívia na estreia, que causou uma onda de empolgação exagerada em parte da torcida e da imprensa, os melhores momentos ofensivos do Brasil vieram quando o time abriu mais o campo, explorando Raphinha bem aberto na direita com inversões de jogo. Não quer dizer que a seleção só possa jogar assim, mas é fato que, para se adaptar ao que Diniz propõe, é necessário mais tempo, mais treino, mais entendimento.
E então vem a questão central: qual é o sentido de contratar um treinador como Diniz de forma interina? Por que ficamos debatendo os pontos de melhora e o futuro do trabalho de um treinador que só tem mais um jogo de Eliminatórias e dois amistosos antes de deixar o cargo? E que, segundo a CBF, será substituído por um profissional que pouco ou nada tem a ver com o seu modelo de jogo, como Carlo Ancelotti? Aliás, quase nenhum treinador no mundo se parece com Diniz. A CBF escolheu talvez o mais autoral dos técnicos para fazer um trabalho interino de um ano, dividindo seu tempo com o clube.
Não faz sentido algum. Mas, por enquanto, é o que temos. Que venha a Argentina na terça-feira, no Maracanã, e os possíveis ajustes de Diniz, que hoje é o técnico, para resolver os problemas que a seleção tem mostrado.
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