Como joga o Brighton de Roberto De Zerbi, a sensação da Premier League
Modesto time do sul da Inglaterra conseguiu classificação histórica à Liga Europa e teve estilo de jogo exaltado por nomes como Guardiola e Klopp
Quando seu time recebe elogios empolgados de treinadores como Pep Guardiola, Jürgen Klopp e Mikel Arteta, é sinal de que algo de certo você está fazendo. É o caso de Roberto De Zerbi, italiano que conseguiu a façanha de levar o modesto (para os padrões da Premier League) Brighton a disputar uma competição europeia, a Liga Europa, pela primeira vez na história. O time ficou em sexto no Campeonato Inglês, superando favoritos com um estilo de jogo envolvente, dominante e, principalmente, único.
Aos 43 anos, De Zerbi está no terceiro trabalho de destaque na carreira. Depois de levar o Sassuolo a brigar na parte de cima da tabela da Serie A entre 2018 e 2021 e comandar o Shakhtar Donetsk em temporada interrompida pela invasão russa na Ucrânia, ele foi o escolhido pelo Brighton para substituir Graham Potter, contratado pelo Chelsea em setembro de 2022 (e demitido em abril deste ano). Desde então, o italiano implantou seu estilo característico na equipe.
Com Potter, o Brighton já fazia um jogo baseado em posse de bola e marcação pressão, dois pilares do modelo de De Zerbi – aliás, o fato de serem estilos parecidos foi um dos motivos pelos quais o italiano foi contratado. O novo treinador, porém, elevou os padrões a níveis ainda maiores. Com ele, tornou-se comum o Brighton ter mais de 70% de posse de bola em jogos da Premier League. E a forma como o time usa a posse também mudou.
A característica mais marcante do Brighton é a ênfase em esperar no campo de defesa para atrair a pressão do adversário e, assim, abrir espaços nas costas da marcação. É comum até ver o goleiro ou os zagueiros do time simplesmente colocarem o pé em cima da bola e ficarem parados, aguardando um atacante rival vir pressionar, para só depois iniciar uma veloz troca de passes. O Brighton é um time que adora ser pressionado: a equipe tem mecanismos bem treinados e quase automáticos para criar superioridade numérica, vencer a marcação e achar seus jogadores mais avançados com espaço.
É tão difícil roubar a bola do Brighton porque o time é treinado justamente para encontrar sempre um jogador desmarcado. Se a marcação é atraída para o jogador que está com a bola, seja ele quem for, outro logo aparece em um espaço vazio para receber. O time usa triangulações rápidas no meio-campo, toques de primeira e jogadas de pivô para superar as pressões e fazer a bola chegar limpa a um jogador de ataque. A partir daí, é velocidade em direção à área. Esse estilo também faz os atacantes ficarem constantemente em situações de um contra um, o que beneficia principalmente o ponta esquerda japonês Kaoru Mitoma, um dos melhores dribladores da liga.
Mas e quando o adversário não sobe a marcação, mas se fecha lá atrás? Aí o Brighton tem mais dificuldade. Por mais que o time tenha vários bons jogadores, adaptados ao modelo de jogo, não é uma equipe com a qualidade individual de um Manchester City para criar tantas soluções diante de uma defesa bem fechada. Por isso, é comum nessas situações ver o time tocar a bola pacientemente, muitas vezes voltando a jogada para os zagueiros e o goleiro, na tentativa de atrair novamente a marcação do adversário, achar espaços e acelerar.
Parece simples, mas é um estilo que demanda, além de muita qualidade técnica, concentração e inteligência para achar os espaços na hora certa, coragem dos jogadores. Mesmo fortemente pressionado, o time quase nunca busca a bola longa. A meta é sempre sair tocando pelo chão, encontrar o homem livre e aí partir rumo ao gol. Os goleiros e zagueiros do time, especialmente o canhoto Colwill, são excelentes com a bola no pé e fundamentais para a proposta.
Além de Mitoma, os outros grandes destaques são o volante equatoriano Moisés Caicedo, um monstro nas pressões e nos desarmes, e com qualidade para participar da troca de passes; e o meia argentino Alexis Mac Allister, que articula as jogadas desde trás e chega na frente para finalizar. Também fez ótima temporada o jovem atacante irlandês Evan Ferguson, fundamental em jogadas de pivô e com movimentação inteligente dentro da área. Sem falar nos jovens talentos sul-americanos que o Brighton tem contratado nos últimos anos, como o equatoriano Sarmiento, o argentino Buonanotte e o paraguaio Enciso, autor de um golaço contra o City.
Com a Liga Europa no calendário da próxima temporada e a provável saída de jogadores cruciais como Mac Allister e Caicedo, De Zerbi terá um desafio ainda maior em 2023/24. O elenco terá que ser reforçado, em qualidade e quantidade, para que as altas expectativas criadas sejam atendidas. Mas o histórico recente do clube mostra que, com a perspicácia no mercado para contratar perfis que encaixam perfeitamente no modelo de jogo do time, é possível sonhar com uma nova temporada mágica.