Em conversa exclusiva à PLACAR, treinador do Al-Taawoun detalhou suas experiências no futebol árabe e expectativas para a nova temporada, com CR7, Benzema e Mané como rivais
O mundo do futebol administra suas expectativas para a próxima sexta-feira, 11 de agosto, quando inicia o agora tão aguardado Campeonato Saudita. Após uma janela de transferências intensa e que surpreendeu o futebol europeu com contratações de peso, os olhos se voltam para o país árabe e tiram a prova se o alto e quase inflacionado investimento será suficiente para elevar a liga às primeiras prateleiras. A presença de Cristiano Ronaldo não é mais uma novidade, mas agora outras estrelas vão compartilhar os gramados com o português. À beira do campo, no comando do modesto Al-Taawoun, Péricles Chamusca é o único técnico brasileiro na Arábia Saudita. Em conversa exclusiva à PLACAR, o treinador baiano de 57 anos contou suas experiências e projeções de uma competição que promete viver a sua melhor temporada.
Há décadas, o chamado ‘mundo árabe’ se inseriu no mercado da bola com propostas milionárias e promessas de se tratar de um oásis da bola. O brasileiro Roberto Rivellino foi um dos primeiros craques a se aventurar por lá. Os petrodólares e a ambição saudita, no entanto, elevaram a participação da região no esporte e, em dezembro de 2022, na última temporada, a chegada da estrela Cristiano Ronaldo ao Campeonato Saudita reverberou em todos os continentes.
“Eu abri o caminho, e agora todos os jogadores estão vindo para cá”, disse o português, que recebeu o craque Sadio Mané e o croata Marcelo Brozovic no Al-Nassr, time da capital Riade. Ao mesmo tempo, equipes rivais como o Al-Ittihad, Al-Hilal e Al-Ahli também se reforçaram. Estrelas como karim Benzema, N’Golo Kanté, Roberto Firmino, Riyad Mahrez e muitos outros trocarem o futebol europeu pelo árabe.
Chamusca despontou no cenário nacional em 2002, com o vice-campeonato do Brasiliense na Copa do Brasil, e dois anos mais tarde conquistou o título nacional pelo Santo André, em final contra o Flamengo, no Maracanã. O treinador passou por clubes como Botafogo, Coritiba, Goiás e Sport, e diz viver bem no Oriente Médio.
“Já estou na minha sexta temporada aqui na Arábia Saudita. A chegada do Cristiano Ronaldo realmente aumentou a divulgação da liga, vários canais de diferentes países começaram a transmitir os jogos. Aumentou também o número de torcedores nos estádios, que já era alto. Os estádios já eram cheios, mas o torcedor ficou ainda mais motivado”, diz Péricles Chamusca, técnico do modesto Al-Taawoun.
Chamusca conseguiu o feito de vencer todos os três grandes da Arábia Saudita na última temporada, com o modesto Al-Taawoun – Divulgação / Al-Taawoun
Se engana quem pensa que a Arábia Saudita não sabe administrar seu dinheiro, que contratações e salários super inflacionados são decisões quase ditatoriais dos príncipes. Tudo faz parte do projeto nacional Saudi Vision 2030, com o objetivo de desenvolver o país em diversos setores, inclusive o esporte: “Aconteceu um investimento em infraestrutura, o país tem se preparado cada vez mais nesse sentido. O futebol é parte do projeto de divulgação do país, preparando a Arábia Saudita para o turismo. Existem muitos projetos em paralelo, de construção de cidades, com muita tecnologia e entretenimento. O futebol é uma ferramenta de divulgação junto a tudo isso”.
Fora do quarteto que forma as grandes equipes da Arábia Saudita (Al-Hilal, Al-Ittihad, Al-Nassr e Al-Ahli), administradas pelo fundo de investimentos estatal, Chamusca viu os rivais receberem um auxílio próximo a 1 bilhão de dólares (cerca de 4,75 bilhões de reais) para grandes contratações na janela: “Os investimentos em jogadores de alto nível devem ficar restritos aos quatro clubes grandes, com exceção do Ettifaq, que também está trazendo jogadores e não estaria no bloco dos grandes, mas está ganhando esse benefício. Os clubes intermediários têm um orçamento maior nessa temporada, mas não para contratar o nível de jogadores que os clubes grandes estão conseguindo”.
Na última temporada, Chamusca conseguiu elevar o desempenho do Al-Taawoun, e terminar na 5ª colocação geral. O brasileiro conseguiu o feito de liderar a modesta equipe da cidade de Buraida em vitórias contra todos os principais times da competição – a tríade formada por: Al-Ittihad, Al-Hilal e Al-Nassr.
“Essa disparidade financeira pode criar diferenças técnicas dentro da liga, mas a gente aposta no coletivo para superar esse aumento do nível técnico de outras equipes”.
Chamusca comanda treino do Al-Taawoun na pré-temporada saudita – Divulgação / Al-Taawoun
Chamusca chegou na Arábia Saudita em 2018 como técnico do Al-Faisaly e fez história ao conquistar a Copa do Rei (primeiro título do clube) – foram três temporadas, com uma breve passagem pelo gigante Al-Hilal no meio do caminho. Depois o brasileiro assumiu o Al-Shabab e trocou a equipe pelo Al-Taawoun, agora seguindo para a segunda temporada no cargo.
“Essa temporada vai ser muito especial, com esse número de jogadores de alto nível que estão chegando. Antes o campeonato era mais equilibrado, jogava o primeiro contra o último e não tinha uma lógica de resultado. Agora, com esse investimento nos quatro grandes, deve-se criar uma diferença técnica. Os clubes intermediários, como o que eu trabalho, vão ter mais dificuldade em atingir resultados positivos”.
Péricles Chamusca não tem dúvida alguma: “A liga saudita deve chegar entre as melhores do mundo, sem dúvidas, se continuar nesse ritmo de investimento nos clubes e em infraestrutura”.
O Campeonato Saudita tem início na próxima sexta-feira, 11 de agosto, mesma data em que a edição 1502 de PLACAR chega às bancas. A reportagem de capa destrincha a “Nova Ordem Mundial” imposta pelos mercados da Arábia Saudita e também da Major League Soccer, a principal liga dos Estados Unidos, com a chegada de Lionel Messi ao Inter Miami.
Edição 1502 chega nas bancas nesta sexta-feira – Reprodução/Placar
Curiosidades do futebol árabe
“Nossa programação sempre é pensada a partir dos horários de reza, que são cinco vezes ao dia. Os treinamentos não podem atrapalhar os horários de reza. Tem jogos que os atletas aquecem, voltam para a reza e depois inicia-se a partida. Os horários são respeitados e bem organizados no sentido da religião”.
“Existem situações peculiares, por exemplo, no período do Ramadã, os treinos começam às 21h porque os atletas só podem se alimentar após o pôr do sol e eles já passaram todo o dia em jejum. No período de calor, a gente também só consegue treinar de noite, porque as temperaturas são muito altas. Também no Ramadã, a gente faz planejamento de viagens na madrugada, que é o momento em que os jogadores estão acordados. Existe logística de vôos para 04h ou 05h por conta desse calendário”.
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