De sapatilhas e chuteiras
A Copa do Mundo prendeu a atenção até de um dos lugares mais sagrados da cultura russa: o Balé Bolshoi
“A Rússia precisa de vitórias.” A frase, cunhada pelo presidente Vladimir Putin uma década atrás, é um bom indicador da baixa autoestima de sua população desde o fim melancólico do regime soviético. Putin, o neoczar que está no poder há dezoito anos (considerando o brevíssimo interregno como primeiro-ministro), tem se empenhado em recolocar o país no centro das discussões globais. Seja tomando decisões políticas controversas, como a anexação da Crimeia, seja investindo em soft power, como ao receber os mais notáveis eventos esportivos do mundo. A Copa de 2018 custou aos cofres públicos o equivalente a 38 bilhões de reais. Em entrevista recente, o premiê Dmitri Medvedev informou que nem um terço desse montante retornou para a economia do país. Mesmo assim, recusou-se a admitir derrota. “A Copa foi um poderoso ímpeto para a melhoria de infraestrutura, serviços médicos e sociais”, disse Medvedev. Tais avanços são até questionáveis. Inegável, porém, foi a enorme injeção de ânimo proporcionada pelo torneio de futebol no moral da população russa, tal como queria Putin.
Aliado à agradável sensação de receber turistas de todos os cantos em seu território, o bom desempenho da seleção local serviu de combustível para a festa nas ruas de Moscou e São Petersburgo. Antes do pontapé inicial, apenas 4% da população acreditava no título. A vitória sobre a todo-poderosa Espanha, que deu à Rússia a vaga nas quartas de final (o que não acontecia desde 1970, ainda como União Soviética), fez com que os mais empolgados sonhassem com a taça. A Copa prendeu a atenção até de um dos lugares mais sagrados da cultura russa: o Balé Bolshoi. O flagrante acima, registrado pela bailarina brasileira Bruna Gaglianone, foi feito durante a vitoriosa disputa de pênaltis contra os espanhóis. As integrantes do primeiro corpo de baile da companhia se preparavam para entrar em cena sem desgrudar os olhos da transmissão do jogo na telinha de um smartphone.
Publicado em VEJA de 26 de dezembro de 2018, edição nº 2614