Copa América: Como era o Brasil e o mundo no último título da Argentina
Se 1993 parece distante para você, imagine para um torcedor argentino. VEJA relembra os grandes acontecimentos daquele ano na política, cultura e esporte
São 26 anos. O último título de alguma relevância da seleção argentina aconteceu no longínquo ano de 1993, quando a equipe liderada pelo cabeludo atacante Gabriel Batistuta bateu o México na finalíssima da Copa América disputada no Equador. Desde então, nossos vizinhos e rivais não repetiram o gesto de levantar uma taça e esse jejum assombrou todas as gerações subsequentes. Em um quarto de século, muita coisa mudou no Brasil e no mundo (outras, nem tanto). Horas antes do confronto decisivo desta terça-feira contra a seleção brasileira, VEJA relembra os fatos relevantes daquela época na política, na cultura e no esporte na lista abaixo. Confira:
A gestação do Real
Fernando Henrique Cardoso ainda era o Ministro da Fazenda do governo Itamar Franco e tinha como missão central acabar com a hiperinflação que corroía o poder aquisitivo dos brasileiros – em 1993, o índice acumulado do ano bateu os 2.477%. Ao lado do então presidente do Banco Central, Pedro Malan, e com a participação de economistas como Edmar Bacha, André Lara Resende, Gustavo Franco e Pérsio Arida, FHC iniciou um programa para estabilizar a economia. Naquele ano, a moeda vigente no país mudou de Cruzeiro para Cruzeiro Real, e que logo após seria atrelada à unidade real de valor (URV), indexador de preços que serviu de base para a criação do Real em 1994.
O “Fusca do Itamar”
O Fusca já era considerado antiquado naquela época. Tanto que havia deixado de sair das fábricas brasileiras da Volkswagen em 1986. Itamar Franco, o político mineiro que assumiu a presidência após o impeachment de Fernando Collor, se assustou com os preços dos carros no Salão do Automóvel e pediu ao mercado um veículo mais acessível ao bolso da população. Para ajudar, o presidente aprovou a lei do carro popular, que dava isenção de impostos para a produção de modelos desse tipo, e assim nasceu o “Fusca do Itamar”. A velha nova, entretanto, não causou grande comoção. O Fusca foi apenas o 18º automóvel mais vendido em 1993 – o Gol, da mesma fabricante alemã, foi o líder de emplacamentos.
A prisão do homem-bomba de Collor
Digna de roteiro, a fuga de Paulo César Farias, o nebuloso tesoureiro da campanha de Fernando Collor à presidência, criador de um esquema que movimentou mais de 1 bilhão de dólares dos cofres públicos, movimentou o ano de 1993. PC foi indiciado em fevereiro em dez inquéritos, por corrupção ativa, emissão de notas frias, falsidade ideológica, evasão de divisas e exploração de prestígio. Desapareceu na véspera da decretação de sua prisão preventiva – ele saiu do país em um avião bimotor, pelo Paraguai – e só foi encontrado em novembro na Tailândia, onde foi preso e enviado de volta para o Brasil. O final dessa história todos se recordam: PC Farias acabou morto em 1996 ao lado da namorada, em uma casa de praia no litoral de Maceió.
O sortudo “Anão do Orçamento”
A relação promíscua entre políticos e as maiores empresas da construção civil do Brasil não é exclusividade dos dias atuais. Há duas décadas, um grupo de parlamentares se envolveu em fraudes em emendas pagas com recursos da União. O escândalo, revelado em 1993 graças a uma Comissão Parlamentar de Inquérito, ficou conhecido como o caso dos “Anões do Orçamento” – a alcunha decorre do fato de os envolvidos serem deputados sem grande expressão, portanto “anões” no sistema político brasileiro. O deputado João Alves, acusado de liderar o esquema de desvio, atribuía seu patrimônio de 5 milhões de dólares ao absurdo de ter ganhado muitas vezes na loteria. “Deus me ajudou”, chegou a afirmar o político, que acabou renunciando ao mandato para evitar a cassação na Câmara. Alves morreu em 2004.
Um aperto de mão histórico na Casa Branca
1993 foi o ano em que Bill Clinton tomou posse como o 42º presidente dos Estados Unidos. Logo no início de seu mandato, o ex-governador do Arkansas protagonizou um encontro histórico. Ele foi o mediador das conversas entre o então primeiro-ministro de Israel, Yitzhak Rabin, e o líder da Organização para a Libertação da Palestina (OLP), Yasser Arafat. O cumprimento público entre dois inimigos históricos, realizado nos gramados da Casa Branca, a sede do governo americano na capital Washington, representava a esperança de se atingir a paz no Oriente Médio. Embora seja uma imagem emblemática, o entendimento entre palestinos e israelenses nunca foi atingido na prática.
O que bombava na música, no cinema e na televisão em 1993
I Will Always Love You foi a música mais tocada do ano, segundo a revista americana Billboard, especializada na indústria musical. A música, entoada originalmente por Dolly Payton em 1974, fez sucesso na voz da diva americana Whitney Houston. A cantora regravou a canção para a trilha sonora do filme O Guarda-Costas, do qual foi protagonista. Já nas paradas brasileiras, Que Se Chama Amor, do grupo de pagode Só Pra Contrariar, foi a faixa mais escutada em território nacional.
O Brasil entrava na rota dos shows internacionais
Ir a algum grande show no Brasil já tornou-se hábito quase corriqueiro. Há 26 anos, porém, não era algo tão comum assim. O ano de 1993 marcou justamente a chegada das megaturnês internacionais ao país. Entre outubro e dezembro daquele ano, astros como Madonna, Michael Jackson e Paul McCartney se apresentaram ao vivo para os brasileiros. Michael Jackson cantou duas vezes no estádio do Morumbi. Madonna também fez dois shows: o da foto acima, em São Paulo, e outro no Maracanã, com direito a arriscar algumas palavras em português e vestir uma camisa do Flamengo.
Ano da consagração do diretor Steven Spielberg
Dois filmes dirigidos por Steven Spielberg foram sucesso de bilheteria em 1993. Jurassic Park trouxe os dinossauros para as telas dos cinema e arrecadou 914 milhões de dólares – a maior receita da indústria cinematográfica até o lançamento de Titanic, em 1997. Já A Lista de Schindler era uma motivação pessoal de Spielberg: filho de judeus, o diretor quis retratar os sofrimentos sofridos na Segunda Guerra Mundial. Os dois foram premiados no Oscar do ano seguinte e a história sobre o Holocausto rendeu a primeira estatueta de melhor diretor para Spielberg.
Na TV brasileira, o que fazia sucesso era a novela Renascer
Uma das novelas de maior sucesso daquela década foi ao ar em 1993. Escrita por Benedito Ruy Barbosa, Renascer tinha como trama principal a briga de José Inocêncio (interpretado por Antônio Fagundes) com seu filho mais novo João Pedro (papel de Marcos Palmeira). A morte da esposa durante o nascimento do caçula fez o fazendeiro criar ódio do menino e a história se desenvolve a partir da relação entre os dois protagonistas. A produção da Globo venceu o Troféu APCA e o Troféu Imprensa de melhor novela do ano.
E no esporte? Em 1993, vimos as últimas vitórias de Ayrton Senna
A temporada da Formula 1 de 1993 foi a última a ser completada pelo piloto brasileiro Ayrton Senna, tricampeão mundial. Com uma McLaren problemática, Ayrton perdeu o título para Alain Prost e a sua imbatível Williams, mas mesmo assim protagonizou grandes momentos. Senna obteve a sexta vitória da carreira nas ruas estreitas do principado de Mônaco, um recorde ainda imbatível. Naquele ano, Ayrton consolidou sua genialidade para guiar um carro de corrida em pista molhada: foi debaixo de chuva que ele terminou em primeiro lugar nos Grandes Prêmios do Brasil (a segunda vitória em casa) e da Europa (quando foi de quinto a primeiro apenas na primeira volta). O brasileiro Rubens Barrichello estreou na categoria naquele ano, pilotando uma Jordan.
Primeiro tricampeonato de Michael Jordan com o Chicago Bulls
Se hoje exaltamos a dinastia estabelecida pelo Golden State Warriors, há duas décadas era uma outra franquia da NBA que cominava a liga americana de basquete. O Chicago Bulls de Michael Jordan ganhava em 1993 seu terceiro título seguido – bateu o Phoenix Suns por 4 a 2 nas finais – e o camisa 23 foi eleito o melhor jogador da decisão nas mesmas três temporadas. O time de Chicago repetiria o feito entre 1996 e 1998, com Air Jordan novamente sendo brilhante e decisivo nas conquistas.
O melhor time do planeta era brasileiro
Em 1993, o São Paulo seguia uma máquina de conquistar títulos. A equipe de Telê Santana conquistou o bicampeonato da Copa Libertadores da América e do Mundial Interclubes – no Japão, o Tricolor paulista venceu o poderoso Milan por 3 a 2. Também era destaque o Botafogo, vencedor da Copa Conmebol em cima do Peñarol, do Uruguai, nos pênaltis. No futebol nacional, o ano foi de dominação alviverde: o Palmeiras começava a colher os frutos da parceria com a empresa italiana Parmalat e encerrou seu jejum de 17 anos sem títulos. O time comandado por Vanderlei Luxemburgo saiu da fila logo com três taças: o Campeonato Paulista, o Torneio Rio-São Paulo e o Campeonato Brasileiro.
Romário garantiu o Brasil na Copa, assegurando o sonho do tetra
Romário não tinha a melhor relação com o então técnico da seleção Carlos Alberto Parreira. O treinador deixou o atacante de fora da equipe durante boa parte das Eliminatórias para a Copa do Mundo de 1994. O risco de não se classificar para o Mundial pela primeira vez na história fez com que Parreira mudasse de ideia. O treinador chamou o camisa 11 de volta na fase decisiva do classificatório. Os dois gols contra o Uruguai, no Maracanã, carimbaram o passaporte brasileiro rumo aos Estados Unidos. O tetra veio no ano seguinte com mais um show de Romário.
1993 foi um ano de alegria…
A Argentina vivia uma fase muito diferente. Havia ganhado a Copa América em 1991 e foi para o torneio de 1993 mais uma vez sem Diego Maradona, ainda o grande craque do país. Para se ter uma ideia, o hoje técnico Diego Simeone, conhecido por ser um volante vigoroso durante a carreira, era o camisa 10 daquele time. Com o atacante Gabriel Batistuta e o goleiro Sergio Goycochea em grande fase, o time despachou o Brasil nas quartas de final nos pênaltis e venceu o México na decisão para ficar com seu último título
… e de vergonha para a Argentina
Dois meses depois do título da Copa América, a Argentina tomou uma goleada de 5 a 0 da Colômbia, em casa, teve que jogar a repescagem para se classificar para a Copa do Mundo do ano seguinte. Velhos conhecidos da torcida brasileira fizeram quatro gols. Freddy Rincón (ex-Palmeiras e Corinthians) e Faustino Asprilla (ex-Palmeiras) marcaram duas vezes cada. Adolfo Valencia completou a goleada. No final do ano e com Maradona em campo, os argentinos superaram a Austrália em dois jogos e se garantiram no Mundial.