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David Luiz e Fernandinho, marcados no 7×1, se redimem pela ‘glória eterna’

Decisão da Libertadores recoloca em evidência protagonistas da inesquecível derrota, e mostra que o tempo pode curar qualquer ferida

Matéria publicada na PLACAR impressa 1492, de outubro de 2022

E o que PLACAR antecipou no Guia da Libertadores, em março, se confirmou. O favoritismo de brasileiros e argentinos foi flagrante (um hermano e três brazucas nas semifinais) e, pela quinta vez na história, teremos uma final verde e amarela. Flamengo e Athletico Paranaense jogam pela “glória eterna” – e, de quebra, ajudam a resgatar o prestígio de três protagonistas de uma de nossas páginas mais melancólicas: o 7 a 1 da Copa do Mundo de 2014. Naquela tarde tristemente inesquecível em Belo Horizonte, o técnico da seleção canarinho era Luiz Felipe Scolari e, no gramado, David Luiz e Fernandinho foram apontados como dois dos culpados pela derrota acachapante diante da Alemanha. Agora, em 29 de outubro, em Guayaquil, no Equador, os três voltam a campo devidamente redimidos, na condição de ídolos das duas torcidas rubro-negras, embora a um deles, apenas, caberá a láurea definitiva.

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Há oito anos, o zagueiro e o meia pareciam definitivamente separados do torcedor brasileiro. Mesmo com carreira consolidada na Europa e múltiplos títulos por milionários e poderosos clubes ingleses, nada parecia capaz de superar as dores daquela fatídica derrota. Mas, como diz o ditado, o tempo cura tudo…

No fim de junho, Fernando Luiz Roza (então com 37 anos recém-completados) anunciou a volta para casa — trocou o Manchester City e o favoritismo na Premier League, além de mais uma Champions League, para perseguir um sonho frustrado em 2005: ser campeão da Libertadores com o Athletico, equipe que o revelou para o mundo. David Luiz Moreira Marinho (35 anos celebrados em abril) já havia feito esse mesmo caminho em setembro de 2021, quando deixou o Arsenal para mostrar seu futebol pelo Flamengo e cumprir uma promessa feita ainda em 2014: “Não vou fugir de nada e nunca vou desistir. Algum dia vou alegrar esse povo, de alguma forma”.

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A grande final é mais um capítulo da rivalidade entre o Furacão e o Mengão. O primeiro grande confronto entre os dois ocorreu em 2011, na Copa Sul-Americana. Em 2016, eles se enfrentaram na semifinal da extinta Primeira Liga. Mas desde 2019 o embate ganhou outra proporção: em quatro temporadas seguidas, as equipes rubro-negras se enfrentaram em jogos mata-mata na Copa do Brasil — com duas vitórias para cada lado. Um tempero especial do jogo deste mês é a presença de Felipão no banco atleticano. Ao conquistar a vaga na decisão ele se tornou o primeiro técnico brasileiro a chegar pela quarta vez à disputa pelo troféu da Libertadores. Se vencer, será seu terceiro título da competição, outra marca inédita.

Para Fernandinho e David Luiz, que vestiam as camisas 5 e 4 na Copa de 2014, as lembranças daquele Mundial estão cada vez mais distantes, ainda que não se apaguem (como não se apagam para nós, torcedores, que sofremos com a eliminação inesperada para uma Alemanha inspirada e impiedosa). No dia do jogo, ficou famoso o desabafo do zagueiro, que usava a faixa de capitão e foi entrevistado pela TV enquanto as lágrimas escorriam soltas pelo rosto, logo depois do assombroso vexame.

David Luiz, do Flamengo, e Du Queiroz, do Corinthians, dividem no Maracanã
David Luiz: a volta por cima com a camisa do rubro-negro carioca –

“Eu só queria poder dar uma alegria para o povo, para essa gente que sofre tanto todos os dias. Infelizmente não conseguimos. Peço desculpas a todos os brasileiros. Só queria ver meu povo sorrindo”, disse ele. Já o volante pouco falou sobre o acontecido. Sua entrevista mais longa a respeito da derrota saiu no jornal inglês The Guardian: “Foi provavelmente o pior momento da carreira de cada um dos jogadores brasileiros envolvidos naquele jogo… Teremos de aprender a viver com isso. Eu nunca assisti à reprise da partida e acho que nunca verei”.

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Mas, como já se disse, o tempo é capaz de curar tudo. David Luiz voltou a vestir a camisa da seleção algumas vezes, mas não foi convocado por Tite para o Mundial de 2018. “Muitas pessoas se esconderam, não quiseram dividir a responsabilidade, e eu carreguei o fardo durante muito tempo sozinho”, lembra ele. Fernandinho, por sua vez, continuou brilhando intensamente no Manchester City (primeiro com o técnico Manuel Pellegrini e, desde 2016, com Pep Guardiola) e participou de quase todo o ciclo de preparação para a Copa da Rússia. Tite o manteve como titular, mas o jogador acabou se tornando o vilão na eliminação para a Bélgica, nas quartas de final, ao marcar um gol contra e cometer um erro grave no segundo gol adversário. A frustração pela nova derrota (somada a algumas ameaças sofridas) o fez pedir para não ser mais convocado.

Fernandinho foi um dos jogadores preferidos de Guardiola no Manchester City -
Fernandinho foi um dos jogadores preferidos de Guardiola no City –

Ainda em 2018, o treinador do escrete canarinho contou que lamentava muito a decisão: “O primeiro atleta que senti vontade de chamar foi o Fernandinho. O número 1. Ele é um jogador extraordinário, joga muito. Entrei em contato, passei a informação, mas essa crueldade chegou à família dele, e ele disse que prometeu não voltar”, afirmou Tite na época.

Tudo isso são águas passadas. A vida seguiu seu rumo e, agora, David Luiz e Fernandinho saboreiam a redenção. Fernandinho foi para o City em 2013, depois de oito anos no Shakhtar Donetsk. Três anos mais tarde, Guardiola chegou para comandar o clube e afirmou que “se um time tiver três Fernandinhos, ele será campeão”. Na temporada 2019-2020, atuou algumas vezes como zagueiro, sempre com classe e segurança. Mas se consagrou mesmo como volante — todos concordam que é um dos melhores do mundo. É o atleta com mais títulos na história dos citizens: catorze em quase uma década defendendo a camisa azul-clara. Após vencer o Campeonato Inglês, em maio deste ano, ele surpreendeu o mundo ao anunciar que não renovaria o contrato. Voltou a Curitiba e, agora, tenta levantar a taça que escapou naquela decisão de 2005 diante do São Paulo.

Fernandinho durante jogo contra o Chivas Guadalajara do México, pela Copa Libertadores da América 2005, no estádio Arena da Baixada -
Fernandinho: camisa 10 do Athletico no vice em 2005 –

David Luiz, por sua vez, reergueu-se como se sabe: jogando em alto nível. Manteve o bom desempenho no Paris Saint-Germain, retornou para o Chelsea em 2016 (tinha atuado pelo clube de 2011 a 2014) como a negociação mais cara da história envolvendo um zagueiro, e seguiu para o rival Arsenal em 2019. O próprio atleta admite que não se adaptou ao estilo do técnico espanhol Mikel Arteta e decidiu encarar o retorno ao Brasil — justamente para o time de maior torcida, no momento em que o rubro-negro carioca buscava retomar o caminho dos títulos aberto dois anos antes pelo português Jorge Jesus. “Pensei muito e tomei uma decisão tranquila, em paz e totalmente feliz. Sei dos meus desafios, sei o tamanho do projeto e como o Flamengo é grande.” Que vença o melhor.

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