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‘Se a prefeitura de Varginha não nos quiser aqui, vamos embora’

Rone Moraes, presidente do Boa Esporte, enfrenta debandada de patrocinadores e aposta na verba de TV para manter o clube em ordem

Por Leslie Leitão, de Varginha |
Rone à beira do campo do CT, que é bancado pela prefeitura de Varginha

Rone à beira do campo do CT, que é bancado pela prefeitura de Varginha

Rone Moraes é um dos três donos do Boa Esporte Clube, minúscula equipe que há seis anos tem sede em Varginha, no sul de Minas Gerais, e que entrou no centro de uma polêmica nacional depois de anunciar a contratação do goleiro Bruno Fernandes, condenado a 22 anos e 3 meses pelo homicídio de Eliza Samudio. Aos 49 anos, foi dele, o presidente, a última palavra para o acordo, firmado na semana passada. E apesar de toda a repercussão negativa, ele dá de ombros. Nem a perda de todos os cinco patrocinadores, nem os protestos nas redes sociais, nem mesmo a ameaça da prefeitura da cidade de rever a parceria – que cede o estádio, o Centro de Treinamento e o hotel para a concentração – o fizeram recuar.

“Não devemos satisfação a patrocinador algum em relação à parte técnica. Eles não  tem que dar aval para uma contratação ser feita, por isso não consultei ninguém. Soube agora que pessoas da prefeitura são contra e que o jurídico lá vai analisar a questão. Pois bem. Se a prefeitura de Varginha não nos quiser aqui, vamos embora. O clube não vai acabar por causa disso”, dispara.

Rone abriu a entrevista coletiva de apresentação do jogador – com toda a pompa das apresentações de grandes estrelas do futebol – dizendo que nenhuma pergunta seria respondida a respeito do crime cometido pelo goleiro, que estava preso desde julho de 2010. Algumas perguntas, claro, foram feitas, mas Bruno se recusou a respondê-las. Para o presidente do Boa Esporte, não é mais hora de falar do passado, uma vez que a Justiça concedeu a liberdade ao atleta, ainda que provisoriamente, até o julgamento do recurso em segunda instância. Alias, o clube está ciente de que uma nova derrota pode levar o goleiro de volta para a cadeia: “É um risco que sabemos e resolvemos correr”, diz.

“Eu cuido das minhas filhas, sei com quem elas andam”, dispara o presidente

Nada parece comover o dirigente que herdou de família o clube, fundado em 1947 e originalmente sediado em Ituiutaba, no Triângulo Mineiro, onde todos foram criados. Pai de três filhos, sendo duas meninas, uma de 19 anos e outra de 16, ele não se rende nem aos apelos da mãe de Eliza Samudio, que luta para enterrar a filha. Questionado sobre o fato de até hoje o corpo não ter sido encontrado, ironizou: “Não posso responder pela mãe da pessoa, sobre o que ela pensa. Eu cuido das minhas filhas, sei com quem elas andam e onde vão… Mas não cabe a mim julgar. Nem tenho que comentar isso”.

A ideia de profissionalizar um time amador fundado em 1947 só surgiu meio século mais tarde. Foi de Rone o projeto inicial, que teve o primeiro pontapé em 8 de agosto de 1998, num jogo entre Ituiutaba e Ipatinga. Em 2011, como a estrutura na cidade natal era precária, mudou tudo para Varginha junto com os irmãos Rildo e Roberto, que participam ativamente de tudo. Ali o trio Moraes aprovou uma lei municipal que prevê apoio da prefeitura local ao clube, algo em torno de 300.000 reais anuais com manutenção do estádio, CT e concentração. Ele e os irmãos se dedicam integralmente ao clube-empresa, onde não recebem um salário fixo. Contador de origem, Rone diz que vive “de outras rendas”, sem especificar quais.

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Em Varginha, o Boa não desperta grande atenção da população. Ano passado, durante a campanha que lhe valeu o título da Série C do Brasileiro, seis dos 12 jogos tiveram público inferior à média de público de 700 pagantes, e os pouco mais de 8.000 torcedores na decisão contra o Guarani registraram o recorde da temporada. Agora, mesmo com toda essa rejeição inicial à contratação de Bruno, o presidente acredita num aumento de publico: “Acho que vamos ter muito mais gente, por causa do ídolo que o Bruno é”, afirma.

Quatro milhões da CBF em 2017

A aparente tranquilidade com que fala do futuro está toda baseada no contrato de televisão. Os direitos de transmissão a que o Boa Esporte terá devem garantir, nas contas do clube, um repasse de cerca de 4 milhões de reais da CBF, só para esta temporada 2017. “Pode ir embora todo mundo que nossa fonte de renda é o dinheiro da tevê. Por isso espero chegar a uma folha salarial de uns 200.000 reais para a disputa da Série B”, afirma.

Apesar de não revelar os valores, o custo agora no primeiro semestre é inferior à metade disso. Radamés, volante criado nas Laranjeiras e famoso por ser o namorado da modelo Viviane Araújo, era o salário mais alto até a chegada de Bruno, que deverá ganhar algo em torno de 30.000 reais.

Os irmãos Moraes tentam se agarrar ao discurso de que a contratação de Bruno é, principalmente, uma ação social de tentar reintegrar à sociedade um cidadão que deixou a cadeia. Usam como exemplo as reformas do estádio municipal e o próprio CT, que contou com a mão de obra de internos do Presídio de Varginha, que fica vizinho ao campo de jogo. Na cidade, no entanto, fala-se que o Boa aposta na valorização do goleiro dentro de campo para lucrar mais adiante. É nisso também que aposta o advogado de Bruno, Lúcio Adolfo. Com seu cliente voltando a ter bons contratos, poderá receber seus honorários.

 

 

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