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‘Fominha’, Flamengo agora tenta rasgar a MP que ajudou a criar

Melhor time do Brasil, com sobras, vem sendo ofuscado pela ganância e falta de bom senso de seus dirigentes. Fla-Flu desta noite já é um vexame

Por Luiz Felipe Castro |
Gustavo Oliveira, BAP, Marcos Braz e Rodolfo Landim, na festa do título da Libertadores em Lima

Gustavo Oliveira, BAP, Marcos Braz e Rodolfo Landim, na festa do título da Libertadores em Lima

O Flamengo tem hoje, com sobras, o melhor time do continente. Com as finanças em dia, um excepcional treinador e craques carismáticos, o rubro-negro pode conquistar nesta quarta-feira 8, seu quinto título apenas em 2020 – no ano em que o coronavírus paralisou o futebol em todo o mundo, time já levou a Recopa Sul-Americana, a Supercopa do Brasil, a Taça Guanabara e, se confirmar o favoritismo e bater o Fluminense nesta noite, no Maracanã vazio, levantará, ao mesmo tempo, a Taça Rio e o título do Campeonato Carioca de forma antecipada. Nas redes sociais, porém, a maior parte dos rubro-negros se divide entre revolta e vergonha. O motivo: a ganância e total falta de bom senso de seus dirigentes.

Um colega jornalista da Argentina, perplexo, me pediu ajuda para entender toda a confusão envolvendo Flamengo, Fluminense, Globo, Ferj, TJD-RJ, Bolsonaro… Me esforcei para ajudar o hermano, em um áudio (estava mais para podcast) de oito minutos. Mas mais complicado do que entender todo o imbróglio por direitos de televisão causado pela Medida Provisória 984/2020, batizada nos corredores de Brasília como “MP do Flamengo”, é compreender onde a diretoria rubro-negra quer chegar com os últimos acontecimentos. Num primeiro momento, suas ações – aparentemente plausíveis e bem fundamentadas – foram celebradas até por alguns rivais. Hoje, desonram os próprios flamenguistas.

Um resumo para quem, com boa dose de razão, não se aprofundou no noticiário esportivo em plena pandemia: no início do ano, o Flamengo não aceitou a proposta da Globo pelos direitos de transmissão do Estadual. Avaliou que os 18 milhões de reais (mesma quantia paga aos outros três grandes do estado), lhes era insuficiente. Direito do clube. Em seguida, participou ativamente da criação da MP que deu aos clubes mandantes o direito de negociarem sozinhos suas transmissões (a Lei Pelé exigia acordo com os dois participantes de cada jogo). Até aí, tudo OK.

A Globo se sentiu lesada e, também com argumentos jurídicos, decidiu tirar seu time de campo, dizendo que o contrato estava rescindido. O Flamengo, então, pôde transmitir seus jogos em casa na FlaTV. Primeiro, celebrou recordes de audiência. Depois, testou o formato no qual cobrava ingresso pelo acesso à transmissão. Foi aí que nasceram as primeiras rusgas com a torcida, que se intensificaram depois de constrangedoras falhas no sistema de pagamento da plataforma escolhida. A diretoria teve de recuar e mostrar o jogo de graça, amenizando a chiadeira. Até então, não havia nada de muito embaraçoso. Até o Fluminense ganhar o sorteio de mando de campo para a final da Taça Rio.

O cenário, então, parecia claro e cristalino: como a Globo rescindiu contrato e sequer poderia mostrar o jogo do Flamengo em condições normais, não teria como haver final no principal canal da TV aberta. E, seguindo as normas da MP, que é válida por 60 dias até ser votada no Congresso (prorrogáveis por outros 60), caberia ao mandante – neste caso, o Fluminense – decidir o que fazer com a transmissão. O clube das Laranjeiras, fez o movimento esperado: anunciou que transmitiria o jogo em seu canal no YouTube, a FluTV. Eis que a esperteza parece ter entrado em cena.

A Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (Ferj), num passo incompreensível, tentou fundir os dois entendimentos (de antes e depois da MP) para exigir da emissora carioca a exibição do jogo. Já um procurador do TJD-RJ, em manobra aparentemente particular, tentou conceder ao Flamengo o direito de mostrar o jogo na FlaTV. Nesta quarta, restando poucas horas para o pontapé inicial, o vice-presidente jurídico do rubro-negro, Rodrigo Dunshee, admitiu em entrevista ao Globoesporte.com, que o clube também entrou na Justiça pedindo o direito de transmissão, alegando que não deveria haver sorteio de mando de jogo em final única.

O Flamengo, agora, tenta rasgar não apenas a MP que ele próprio ajudou a criar, mas também o regulamento do Campeonato Carioca que assinou meses atrás. Abaixo, o artigo 26, parágrafo primeiro, das normas da competição deixa claro que só haveria um mandante, o vencedor do sorteio. Foi deste regulamento que o atual campeão se valeu para transmitir, apenas onde quis, seus dois últimos jogos, inclusive a semifinal (em jogo único):

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Trecho do regulamento do Campeonato Carioca Ferj/Reprodução

Dunshee contraria, inclusive, a si próprio. Na semana passada, em entrevista a PLACAR, ele afirmou com todas as letras que o direito de transmissão cabe exclusivamente ao mandante. O presidente do Fluminense, Mario Bittencourt, usou as redes sociais para denunciar o que chamou de “Gatoferj”, ironizando o apoio dos dirigentes e juízes ao Flamengo.

Até o início do jogo, às 21h30, tudo pode acontecer, mas nada que não seja a transmissão exclusiva do jogo nas redes sociais do Fluminense poderá ser considerado aceitável. Fora isso, qualquer que seja o resultado do jogo, até mesmo uma (totalmente possível) goleada do Flamengo, será uma mancha na história do “Mais Querido”. O filme da federação carioca já está queimado há anos, seria apenas mais um vexame. Mas o Flamengo ainda pode ouvir seus torcedores nas redes sociais e evitar tamanho constrangimento.

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