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Neymar e a jornada do herói

A zuñigação de Neymar não tem impacto apenas nas chances do hexacampeonato, que a princípio encolheram drasticamente. Ao zuñigar com um joelhaço nas costas – por má-fé ou por falta de jeito para jogar bola, agora já não faz diferença – o principal jogador brasileiro e uma das estrelas da competição, o lateral colombiano pode […]

Por Sérgio Rodrigues |
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Parece uma boa ideia parar de azucrinar Fred. Depois de Neymar, não há ninguém no elenco com mais vocação para fazer gols VEJA

A zuñigação de Neymar não tem impacto apenas nas chances do hexacampeonato, que a princípio encolheram drasticamente. Ao zuñigar com um joelhaço nas costas – por má-fé ou por falta de jeito para jogar bola, agora já não faz diferença – o principal jogador brasileiro e uma das estrelas da competição, o lateral colombiano pode ter inaugurado uma nova fase da Copa e, de quebra (sem trocadilho), uma nova fase na carreira de Neymar.

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Vamos com calma: isso não seria dar cartaz demais ao zuñiguismo, que afinal de contas não passa de uma força destrutiva, aquilo que se opõe ao que o futebol tem de melhor? Bom, a história nunca foi escrita só por heróis: vilões contam da missa pelo menos a metade. Depois de tudo o que já se disse e escreveu sobre a perda inestimável que a fratura de Neymar representa para quem gosta de futebol, é na caixa de ferramentas dos escritores, dos contadores de histórias, que proponho buscar um jeito menos deprê de encarar o efeito colateral da vitória que classificou o Brasil para a semifinal contra a Alemanha.

Como já se disse, muda tudo para nós de agora em diante. Sem seu único gênio, o time brasileiro – que no primeiro tempo contra a Colômbia jogou pela primeira vez um futebol coletivamente impressionante – perde tanto em qualidade que tira de seus ombros o fardo do favoritismo. Isso pode ter efeito positivo. Transformado em azarão caseiro, com um álibi pronto para a eventual derrota, o Brasil pode ficar mais leve. Junte-se a isso a circunstância de que, como naqueles filmes hollywoodianos, “agora é pessoal”, e temos um cenário clássico de superação e entrega. O time deve se fechar em reconhecimento às suas limitações para buscar vitórias em um único golpe mortal – um roteiro feito sob medida para o velho estilo Felipão.

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Nesse novo enredo muda coisa à beça, e uma delas pode ser resumida na constatação de que precisaremos de Fred mais do que nunca. Sim, é claro que o centroavante do Fluminense não vem jogando bem, embora, a meu ver, tenha mostrado no último jogo algum progresso no papel de pivô. Em todo caso, parece uma boa ideia parar de azucriná-lo. Depois de Neymar, não há ninguém no elenco com mais vocação para fazer gols.

Na arte narrativa clássica, a provação traumática do herói costuma ocorrer entre o segundo e o último terço da história e é um ponto fundamental dos mitos e das grandes sagas, segundo o famoso esquema da “jornada do herói”, proposto pelo antropólogo americano Joseph Campbell. De todos os percalços que se interpõem entre o protagonista e a vitória, é o momento mais crítico da trama, aquele em que ele enfrenta nada menos que a morte. Ultrapassado esse ponto, nada mais o detém.

A depender do ponto de vista, o herói dessa história pode ser a seleção brasileira, que estaria então rumo a um hexacampeonato inevitável, ou o próprio Neymar, em sua jornada para se consagrar como o melhor jogador do mundo – um caminho em que, depois de cruzar com Zúñiga, ninguém mais poderá segurá-lo. Claro que nada disso é garantido. Só não convém menosprezar – muito menos no futebol – a força dos mitos ancestrais.

De uma forma ou de outra, uma coisa não se pode negar: o roteirista desta Copa adora emoções fortes e reviravoltas improváveis, embora, no fim das contas, tenha preferido apostar no fundamento conservador dos personagens fortes. De agora em diante, com dez títulos mundiais na bagagem dos semifinalistas, acabou a invencionice.

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